Leiam o depoimento de uma paciente com DP sem demência, que administra sua vida como dona de casa, vai a consulta sem ser acompanhada; transcrevo suas palavras carregadas de sentimento e crença sobre fios que saem de seus dentes:
Paciente: “Ele é feito esse pelinho, assim feito um fiapuzinho, como se você tivesse chupado uma manga e tivesse ficado um fiapo no dente, sabe? Aí eu sinto que ele sai e passo a língua assim, aí eu sinto, ele saindo, às vezes, eu pego um pedaço de papel, um pedacinho de guardanapo, um papel de guardanapo, aí boto assim entre um dente e outro aí eu sinto que puxa”.
Interlocutor: Aí a senhora consegue tirar.
Paciente: Eu consigo tirar, mas não dá pra vê direito, porque é tão fino que não dá pra vê, às vezes, eu consigo vê que é um fiozinho bem fininho cor-de-rosa, sabe? Às vezes, não sai de um fiozinho sai uma uma…uma coisa como se fosse uma gelatina sabe? Uma gelatina que fica agarrada no meu dente, aí com um guardanapo e tiro tudo. Não é um sufoco o meu caso?
Interlocutor: Agora só sai de um dente?
Paciente: Não, sai de todos eles.
Interlocutor: Mas, sai de mais de um do que de outro?
Paciente: É, sai mais de um do que do outro. Sai mais desse daqui sabe? Tem um queijal também aqui no canto, que tá saindo mais um pouco agora sabe? Mas o que me aperreia mais é esse agora, às vezes eu pego um pedacinho de algodão, faço aquela bolinha de algodão e boto dentro do dente. Aí é que eu descanso um pouco, porque esse é o que sai mais, aí é que melhora um pouco, porque não fica saindo né? Mas, se eu tirar a bolinha de algodão aí começa a sair.
Interlocutor: Mas, a senhora agora arrumou uma nova técnica. O que é que faz o chiclete?
Paciente: Não, o chiclete agarra nele mesmo quando tá saindo, o chiclete agarra nele, aí tira.
Interlocutor: Aí o chiclete vai para o lado que tá saindo o pelinho?
Paciente: Eu boto, eu sinto que tá saindo nesse aqui, eu boto nele sabe? Aí naquele lugar já não tá mais, aí no outro lado a mesma coisa, tô sentindo que tá saindo aí eu boto o chiclete pra o outro lado, e vivo nessa situação.
Interlocutor: Agora, a senhora fica mastigando chiclete o dia inteiro.
Paciente: O dia inteiro.
Interlocutor: Não fica cansada?
Paciente: Fico, mas não é pra mastigar. Eu fico com ele na boca, quando eu sinto onde é que tá saindo aí eu boto o chiclete no lugar.
Interlocutor: Faça aí o movimento pra eu ver como é.
Paciente: Pronto, esse aqui da frente. Eu boto, aí deixo, porque eu tiro o chiclete, ele tá saindo.
Interlocutor: Ah! Porque o chiclete puxou.
Paciente: Puxou ele, porque o chiclete não agarra né?
Interlocutor: Ah tá ótimo. Tá bom”.
Situações delirantes podem ocorrer antes ou durante dos sintomas motores na DP, quando pacientes acreditam que já estiveram em lugares nunca idos, como no seu consultório, mesmo todos contra suas opiniões. Especialmente em pacientes com déficit cognitivo, a alucinação visual pode ser facilmente desencadeada pelo uso do tratamento de remédios anticolinérgicos, possivelmente porque existe importante perda de células nervosas no córtex temporal envolvidos com o reconhecimento visual em pacientes com demência associada à DP.
Dr. Paulo Brito
CRM 6322-PE
Professor de Neurologia
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